A violência escolar como um reflexo da sociedade

No dia 13 de março de 2019, o Brasil foi surpreendido por um ataque de dois jovens armados dentro de uma escola no município de Suzano, resultando em 11 feridos e 10 mortos, incluindo os próprios atiradores. Investigações apontaram que a dupla de atiradores planejou o massacre há mais de um ano e recebia apoio nos chans, sites em que o usuário é anônimo e de difícil rastreio.

Logo após o massacre, muitos jornalistas, especialistas e curiosos começaram a procurar o “gatilho” que teria levado os atiradores a cometer o crime. Muitos foram os culpados, como videogames, bullying e problemas patológicos que em parte, são explicados pelo fenômeno “folie à deux”, termo em francês para se referir a um transtorno psicótico compartilhado a dois. Porém, poucos abordaram qual a influência da nossa sociedade: Maria de Lourdes Teixeira, psicóloga da PUC e especialista na área da Infância e Adolescência, afirma que “A gente tem que partir da seguinte ideia: ninguém nasce bandido. Precisamos pensar o que na história de vida desses jovens e o que no funcionamento da sociedade levam a esse ato”¹.

Luciana Szymanski, professora do departamento de psicologia social da PUC¹, diz que é muito reducionista culpabilizar o bullying como o responsável pelo ataque. Se analisarmos outros ataques que ocorrem pelo mundo em escolas, veremos que a maioria dos massacres são realizados por alunos homens e brancos, socialmente privilegiados pela nossa estrutura de sociedade*. No entanto, tais indivíduos são constantemente afetados pela cultura de masculinidade tóxica e de banalização da vida, reforçadas constantemente pela mídia.

A fotógrafa Ítalo-britânica Jessica Amity criadora do projeto “To be A Man”², que visa desconstruir padrões tóxicos de masculinidade, escreve em seu site “[…] o fracasso em abraçar essas qualidades ‘viris’ muitas vezes traz consequências severas, não apenas para os homens, mas para os que os rodeiam. Por exemplo, pode ter um impacto negativo na sua própria saúde mental, possivelmente levando à depressão, abuso de substâncias e suicídio, bem como agressividade, objetificação e violência para com as mulheres e outros homens, sentimentos homofóbicos e transfóbicos e assim por diante.”³ (Amity, tradução Hypeness). Tal masculinidade tóxica, que coíbe qualquer expressão de fragilidade e impotência, combina-se perigosamente com uma cultura armamentista crescente no Brasil nos últimos anos. Como consequência, há uma resposta violenta contra qualquer instituição que tente desconstruir tal padrão de masculinidade ou que coloque tais indivíduos em contradição.

A escola, ao simbolizar um espaço de aprendizagem e debate, torna- se alvo de manifestações violentas desse tipo, em que tolerância e compreensão tornam-se totalmente suprimidas. No entanto, os discursos pós-ataque convergem para a militarização das escolas e até o armamento de professores, o que não solucionaria os problemas que levaram a tal crime e reforçaria a cultura de violência. Segundo a socióloga Miriam Abramovay “a escola teria que ser diferente, mais receptiva, mais agregadora e mais conectada com a cultura juvenil”.

A cultura de violência que se materializou em Suzano vai muito além dos muros da escola: ela se perpetua através da política, da mídia e das redes sociais. Porém, não se pode negar e deixar de se investir na escola como uma instituição social capaz de integrar os jovens e a comunidade a fim de se propagar tolerância e uma cultura de paz. Dessa forma, as transformações necessárias para acabar com tal cultura de violência podem ter dois sentidos: tanto de dentro da escola para fora, quanto da própria sociedade para dentro do espaço escolar.

Ass: Géssio Mori e Augusto Nascimento

Fonte: [1] MONTESANTI, Beatriz ; CARVALHO, Priscila. Análise: Nunca há
apenas uma explicação para massacres como o de Suzano. São Paulo,
15 mar. 2019. Disponível em:
https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-
noticias/2019/03/15/bullying-odio-e-loucura-a-dois-os-motivos-que-
levam-ao-massacre-de-suzano.htm. Acesso em: 11 abr. 2019

[2] https://www.jessicaamity.com/blog/2019/1/23/to-be-a-man-a-
portrait-series-challenging-the-concept-of-toxic-masculinity. Acesso em:
24 abr. 2019
[3] https://www.hypeness.com.br/2019/02/ela-criou-uma-serie-de-
retratos-para-desafiar-o-conceito-de-masculinidade-toxica/. Acesso em:
24 abr. 2019

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