No cenário contemporâneo, o acesso aos meios digitais se mostra cada vez mais democratizado e acessível, uma vez que a rede mundial de computadores, internet, possui uma enorme capacidade de conectar pessoas por todo globo. A partir dessa capacidade de conexão, o fluxo cada vez mais intenso de informações tornou-se algo comum em sociedades ao redor da terra.
Com base nisso, é seguro dizer que dentre os mais diversos tipos de informações que circulam pela rede, uma em particular merece mais atenção: as informações falsas. Voltar a concentração para essa classe em específico não significa julgar o mérito de produzir uma informação falsa, mas, uma vez que elas são produzidas, quais são suas causas e consequências para os usuários da rede.
O processo de racionalização compreende etapas como a leitura, entendimento e checagem, os quais são completamente menosprezados devido ao curtíssimo intervalo de tempo para a chegada de novas notícias. Em paralelo a isso, cada vez mais se observa uma ascensão alarmante das “fake news”, fenômeno que se prolifera de maneira exponencial na imensidão da internet. Byung-Chul Han, em seu livro: Infocracia, afirma que a velocidade de propagação de informações é diretamente responsável pela falta de racionalidade no momento de internalização da informação. Por isso, o autor estabelece que as fake news se espalham muito rápido, pois a própria checagem leva mais tempo do que o surgimento de novas notícias falsas, o que acaba levando a uma luta sem fim entre a checagem e o aparecimento de uma nova informação.
A partir dos pontos apresentados por Byung-chul Han, é importante estabelecer uma conexão entre os algoritmos de entrega de informações e as intenções presentes nas grandes empresas que os utilizam. Segundo o dicionário “Oxford Languages” algoritmo é um conjunto de regras e procedimentos lógicos perfeitamente definidos que levam à solução de um problema em um número finito de etapas. Sendo assim, parece válido dizer que a implementação de algoritmos por todas as grandes plataformas de comunicação buscam maneiras de garantir a manutenção do tempo de acesso através da medição do engajamento de seus usuários. Tal procedimento contribui para processo de privação à racionalidade/criticidade de quem recebe tais informações.
No âmago desse fenômeno, as pseudociências encontram espaço para florescer, apresentando-se como verdadeiros bastiões do conhecimento alternativo. Seja no campo da saúde, astronomia, ou em teorias da conspiração mais elaboradas, essas pseudociências muitas vezes ganham adeptos fervorosos que, influenciados por uma mistura de desinformação e desconfiança nas instituições tradicionais, abraçam ideias que carecem de base científica sólida.
Simultaneamente às fake news, impulsionadas por algoritmos que privilegiam o sensacionalismo, as pseudociências espalham-se como um vírus digital, contaminando a mente coletiva. A disseminação rápida de informações falsas não só confunde os consumidores de informação, mas também compromete a capacidade da sociedade de discernir entre o verdadeiro e fictício, uma vez que a racionalidade requer tempo. Byung-Chul Han afirma que: “Na sociedade da informação, simplesmente não temos tempo para ação racional, a coação da comunicação acelerada nos priva da racionalidade.”
Os algoritmos das redes sociais também privilegiam a formação de bolhas digitais, que são comunidades que se identificam com alguma narrativa comum entre seus membros. As narrativas que formam essas comunidades carecem de racionalidade e por isso precisam utilizar-se de outros artifícios para chamar as pessoas para dentro de suas bolhas.
Um desses artifícios é o Afeto, aqui entendido como “as afecções do corpo, pelas quais sua potência de agir é aumentada ou diminuída, estimulada ou refreada, e, ao mesmo tempo, as ideias dessas afecções” (Spinoza, 2007). É no momento em que a racionalidade confronta as bolhas que os afetos se tornam tão importantes, pois num mundo em que ela se torna fraca, ou quase inexistente, os afetos tomam seu lugar, “Afetos são mais rápidos do que a racionalidade” (Han, 2022). É por essa razão que observamos discursos completamente afetivos e irracionais dentro dessas comunidades. Dessa maneira, qualquer tentativa de convencimento a partir de um discurso racional será inútil, já que é praticamente impossível ter um diálogo racional contra afetos e identificação.
Se observarmos os discursos que as comunidades pseudocientíficas proferem nas redes fica claro seu apelo afetivo. Elas sempre se colocam como “conhecedoras de uma verdade negada ao povo”, ou ainda, “estão buscando libertá-los da alienação científica”, com a finalidade de engajar emocionalmente as pessoas. Numa sociedade em que o fim da racionalidade prevalece, esse tipo de discurso é extremamente eficaz e por isso esses movimentos vêm ganhando força. E enquanto vivermos em uma infocracia, sistema marcado pelo fim da racionalidade, não há previsões de melhorias.
Assinado por: Alisson Pereira Maiores, Jhonathas Henning Mesquita ,Victor Hugo Pazotto
Referências Bibliográficas:
Han, Byung-Chul. Infocracia: Digitalização e a crise da democracia. [S. l.: s. n.], 2022.
Spinoza, B. Ética, 2ª edição. São Paulo: Editora Autêntica, SP, 2007.