Robert Anson Heinlein foi um dos mais importantes escritores de ficção científica do século XX, juntamente com Arthur C. Clark e Isaac Asimov. Entre as mais relevantes obras do autor, estão Stranger in a Strange Land (1961), Starship Troopers (1959), Double Star (1956), e The Moon is a Harsh Mistress (1966), premiadas com o Hugo Awards, um dos mais importantes prêmios da literatura fantástica e de ficção científica. Suas obras, entre contos e romances, envolvem principalmente temas espaciais, político-sociais e de avanços tecnológicos que permearam a cultura da época e até hoje inspiram leitores e escritores do gênero.
O conto desta resenha foi publicado na revista Fantasy and Science Fiction Magazine em 1959 e tem viagens no tempo como temática, também explorada em outros contos como By His Bootstraps e The Door Into Summer. No começo da narrativa, os leitores são apresentados à Mãe Solteira, um homem de vinte e cinco anos que ganha a vida escrevendo histórias de confissão para revistas, a partir de uma conversa com o barista – narrador do conto. A Mãe Solteira conta sobre sua infância no orfanato onde foi abandonada e seus planos de vida até se apaixonar por um rapaz e dar a luz a uma menina, que foi raptada do hospital com um mês de vida, e em seguida passar por um procedimento de redesignação de sexo.
O barista oferece à Mãe Solteira uma oportunidade de acertar as contas com aquele culpado por toda a desgraça de sua vida em troca de que pense a respeito de um emprego de agente temporal que está a lhe oferecer. Os agentes temporais trabalham corrigindo acontecimentos antes que eles aconteçam, como evitar explosão de bombas e impedir o estouro de guerras a partir de pequenos “remendos” no tempo. Neste contexto, o leitor pode refletir sobre a linearidade – ou não – do tempo e sobre a ação de serviços militarizados de segurança.
Neste conto, o autor escolhe uma abordagem mais provocativa do que expositiva. Ele não dá muitos detalhes sobre a corporação militar para a qual os agentes temporais trabalham e nem como ou quais acontecimentos são remendados no tempo. Ao longo da narrativa, é possível inferir que os agentes temporais trabalham evitando ou resolvendo paradoxos, mantendo assim uma concordância entre passado e presente. Na adaptação cinematográfica (O Predestinado, 2014), temos a impressão de que o serviço secreto é uma força policial que volta no tempo para consertar acontecimentos que foram alterados de alguma forma.
O narrador então, naquela que é sua última missão de recrutamento, leva Mãe Solteira e os leitores em uma viagem temporal para momentos do passado e futuro da vida de Jane, a primeira identidade de Mãe Solteira. Numa narrativa envolvente e perspicaz, Heinlein conduz o leitor à descoberta de uma grande reviravolta na vida de Jane nos fazendo questionar sobre a existência ou não do livre arbítrio e do determinismo dos acontecimentos, personificado pela personagem principal. A consciência de que está presa no ciclo a torna livre ou prisioneira?
Ao final do conto, o narrador reflete sobre os acontecimentos de sua vida num monólogo emblemático, que divide opiniões até hoje. “Eu sei de onde eu vim, mas de onde todos vocês, zumbis, vieram? (…) Vocês não estão aí de verdade. Não existe ninguém além de mim – Jane – aqui sozinha no escuro. Sinto sua falta terrivelmente!”. Há quem diga que os zumbis são todas as outras pessoas que têm antepassados, sendo assim posta fora de controle sobre sua origem e destino. Ainda, há quem defenda que o narrador se refere a todas as outras versões de si mesmo que conhecera, enxergando-as dualmente como outras pessoas assim como as outras. Em qualquer um dos casos, Heinlein nos convida a refletir sobre o livre arbítrio e o determinismo das ações de suas personagens. Quem é livre? Jane, por ter o poder de conduzir sua própria vida ou os outros que não tem poder nenhum sobre os acontecimentos do mundo?